Quem é Viktor Bout, traficante de armas ligado à troca por americanos detidos por Moscou?

Suspeito de traficante de armas russo Viktor Bout (C) é escoltado por oficiais da Drug Enforcement Administration (DEA) depois de chegar ao Aeroporto do Condado de Westchester em White Plains, Nova York, 16 de novembro de 2010. REUTERS/Departamento de Justiça dos EUA/Folheto/Foto de arquivo

LONDRES, 1º de agosto (Reuters) – A vida de Viktor Bout, o traficante de armas russo preso nos Estados Unidos e ligado a uma possível troca por dois cidadãos norte-americanos detidos por Moscou, às vezes soa como um thriller de espionagem absurdo.

Apelidado de “o mercador da morte” e “o destruidor de sanções” por sua capacidade de contornar embargos de armas, Bout, 55, era um dos homens mais procurados do mundo antes de sua prisão em 2008 por várias acusações relacionadas ao tráfico de armas.

Por quase duas décadas, Bout se tornou o traficante de armas mais notório do mundo, vendendo armas para estados rebeldes, grupos rebeldes e senhores da guerra assassinos na África, Ásia e América do Sul.

Sua notoriedade era tal que sua vida ajudou a inspirar um filme de Hollywood, O Senhor da Guerra de 2005, estrelado por Nicholas Cage como Yuri Orlov, um traficante de armas vagamente baseado em Bout.

Mesmo assim, as origens de Bout permaneceram envoltas em mistério. As biografias geralmente concordam que ele nasceu em 1967 em Dushanbe, então capital do Tajiquistão soviético, perto da fronteira com o Afeganistão.

Um linguista talentoso, que mais tarde usou seu domínio do inglês, francês, português, árabe e persa para construir seu império internacional de armas, Bout supostamente frequentou o clube Dushanbe Esperanto quando jovem, tornando-se fluente na língua artificial.

Seguiu-se uma passagem pelo exército soviético, onde Bout disse ter alcançado o posto de tenente, servindo como tradutor militar, inclusive em Angola, país que mais tarde se tornaria central para seus negócios.

O grande avanço de Bout veio nos dias após o colapso do bloco comunista em 1989-91, lucrando com um súbito excesso de armamento descartado da era soviética para alimentar uma série de guerras civis fratricidas na África, Ásia e além.

Com a vasta frota aérea da União Soviética se desintegrando, Bout conseguiu adquirir um esquadrão de cerca de 60 aeronaves militares soviéticas antigas baseadas nos Emirados Árabes Unidos, através do qual ele poderia fornecer seus produtos ao redor do mundo.

NEGÓCIOS SOBRE POLÍTICA

Uma biografia de 2007 intitulada “Merchant of Death: Guns, Planes, and the Man Who Makes War Possible”, de Douglas Farah e Stephen Braun, relatou os seguintes detalhes do comércio sombrio de Bout.

De uma base no emirado de Sharjah, no Golfo, ele entrelaçou seu império de tráfico de armas com um negócio de logística aparentemente inócuo, sempre insistindo quando questionado que ele era um empresário legítimo com clientes respeitáveis ​​e nenhum caso para responder.

Mesmo assim, Bout, que apareceu pela primeira vez no radar da CIA em meio a relatos de um sombrio cidadão russo negociando armas na África, era na virada do milênio um dos homens mais procurados do mundo.

Mas Bout, cujos clientes incluíam grupos rebeldes e milícias do Congo, Angola e Libéria, tinha pouca ideologia firme, tendendo a colocar os negócios acima da política.

No Afeganistão, ele vendeu várias armas para insurgentes islâmicos do Talibã e seus inimigos na Aliança do Norte pró-ocidental, de acordo com “Merchant of Death”.

Ele disse que Bout forneceu armas para o ex-presidente liberiano e senhor da guerra Charles Taylor, agora cumprindo uma pena de 50 anos de prisão por assassinato, estupro e terrorismo, para várias facções congolesas e para o grupo militante islâmico filipino Abu Sayyaf.

O fim só veio em 2008, depois que uma elaborada operação policial da Agência Antidrogas dos EUA viu Bout ser rastreado em vários países até um hotel de luxo em Bangkok.

Durante uma operação policial espetacular, Bout foi flagrado na câmera concordando em vender 100 mísseis terra-ar a agentes disfarçados dos EUA que se apresentavam como representantes das guerrilhas esquerdistas das FARC da Colômbia, que eles usariam para matar tropas americanas. Pouco depois, ele foi preso pela polícia tailandesa.

Após mais de dois anos de disputas diplomáticas em que a Rússia insistiu em voz alta que Bout era inocente e seu caso politicamente acusado, Bout foi extraditado para os Estados Unidos, onde enfrentou uma série de acusações, incluindo conspiração para apoiar terroristas, conspiração para matar americanos e lavagem de dinheiro.

Bout foi julgado pelas acusações relacionadas às FARC, que ele negou, e em 2012 foi condenado e sentenciado por um tribunal de Manhattan a 25 anos de prisão, a pena mínima possível.

Desde então, o estado russo está ansioso para recuperá-lo.

NOS ESTAMOS DISPOSTOS A TROCAR DE FONTE

Em 27 de julho, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, disse que Washington havia feito “uma oferta substancial” à Rússia para liberar a estrela da Associação Nacional de Basquete Feminino (WNBA) Brittney Griner e o ex-fuzileiro naval dos EUA Paul Whelan.

Dois dias depois, Blinken disse que teve uma “conversa franca e direta” por telefone com o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, e pressionou Moscou a aceitar a proposta. consulte Mais informação

Blinken se recusou a dizer o que os Estados Unidos estavam oferecendo em troca de Griner e Whelan. Uma fonte familiarizada com a situação confirmou uma reportagem da CNN de que Washington estava disposto a trocar Bout como parte de um acordo. consulte Mais informação

Lavrov sugeriu a Blinken que os dois lados voltassem à diplomacia silenciosa sobre a questão da troca de prisioneiros “em vez de lançar informações especulativas”, disse um comunicado do Ministério das Relações Exteriores da Rússia.

Lavrov disse que a extradição de Bout da Tailândia foi “uma injustiça gritante” e sugeriu que ele era inocente.

Comentários de uma entrevista de 2012 com o juiz que presidiu o julgamento de Bout em Nova York de que sua sentença de 25 anos foi “excessiva” foram ocasionalmente aproveitados pela mídia russa que defende o retorno de Bout para casa.

No início deste ano, surgiram especulações de que Bout seria trocado por Trevor Reed, um veterano do Corpo de Fuzileiros Navais dos EUA preso na Rússia por acusações de agressão. Reed foi finalmente libertado em troca de Konstantin Yaroshenko, um piloto russo preso nos Estados Unidos por acusações de tráfico de drogas.

Para especialistas, o interesse contínuo do Estado russo em Bout, além de suas habilidades e conexões no comércio internacional de armas, sugerem fortemente os laços de inteligência russos.

Em entrevistas, Bout disse que frequentou o Instituto Militar de Línguas Estrangeiras de Moscou, que serve como campo de treinamento para oficiais de inteligência militar.

“Bout era quase certamente um agente do GRU, ou pelo menos um ativo do GRU”, disse Mark Galeotti, especialista em serviços de segurança russos no think tank Royal United Services Institute, referindo-se ao serviço de inteligência militar da Rússia.

“Seu caso se tornou totêmico para os serviços de inteligência russos, que querem mostrar que não abandonam seu próprio povo”, acrescentou Galeotti.

De acordo com Christopher Miller, jornalista que se correspondeu com neonazistas presos junto com Bout na Penitenciária Marion, em Illinois, o ex-traficante de armas mantém uma foto do presidente russo Vladimir Putin em sua cela e diz que não acredita que a Ucrânia deveria existir. como um estado.

Contatada pela Reuters pelo serviço de mensagens WhatsApp, a esposa de Bout, Alla, que mora em São Petersburgo, disse: “Esperamos muito que tudo seja resolvido e um acordo seja alcançado.

“Tudo o que resta a fazer é orar”, acrescentou.

Reportagem da Reuters Edição de Mark Heinrich